Do que não digo…
Na palavra cerceada,
De sopro forte e latente
Em alquimias goradas
No cruzamento das mentes,
Há um cantar de Janeiros
Que a brisa quente ignorou
E em seu chegar derradeiro
De sonhos findos me achou…
Na palavra que me calo
Paira um deserto em demora
De um certo tempo de amoras
Que o oásis não logrou…
Há uma lembrança de cheiros
Nos campos do Outubro frio…
Frondosa a mata, em roteiro,
Num deslizar de arrepios!
E existe um olhar achado
Nas manhãs de terno abrigo,
Praça do adeus desbravado
Num galopar sem castigo!
Há ribeiros de água solta
Nessa palavra que habito,
Mantos de prata que agito
No despojar da revolta.
Há uns dias em que parto
Nas palavras de sair
E vagueio na paragem…
Sou luz breve da certeza
De um fogo de ser intenso
Que em sequestro me detém.
Cego eu de paixão vítrea!
Na febre de ser mais dias
Que um viver de dias farto
E errâncias por definir,
Perco-me lá… pela margem
Sentando a vida em leveza,
Num torpor liso, de incenso,
Que pairando me sustém!...
Sei da noite inquestionável,
Desdobrada à minha frente,
A que um dia me rendi
Em cocktails de gente,
Na rasura descartável
Dos fracassos que bebi!
Havia nela um princípio
Sem fogo, mas de artifício,
Nos abraços de néon…
Estampando telas de olhar
Por entre orgias de som,
Calava um grito de mar
Na vida que tinha sede…
Das alturas, não da rede!
Sento-me aqui, penso o mundo…
É denso o mato, em ocaso,
Onde me embrenho, lunar…
De encruzilhadas me afundo,
Veludo em teias de acaso,
Presas do tempo a chorar!
Lembro as tardes do dizer,
Abraços de um tempo a ferver
Acordes de água em marulho!
Deito o meu olhar vazio
No lençol de toque frio,
Versos-cama em que mergulho.
Falo de mim… e da espera,
Nela me acho sem terra…
Nesse partir já corrente
Sou o rompante, sem brio,
De uma alvorada em desvio
Que de mim o caos ressente.
Quisera eu ser metade
De um sonho a parir verdade
E assim mesmo, já bastante!...
Mas… sou de feitos tardia…
Só me encontro, já distante,
No silêncio que há nos dias…
Sou carta de marinhar,
Farol de estrelas que arrisco
E pela saudade me abismo…
Morro no chão de voltar!
Que me cansei de nascer
Na palavra que não digo!
Sou sempre a nau de saída
Que navega a despedida
Nos olhos fartos de ver!...
Ana Vassalo
25-05-2009
Posted 25-05-2009
Origem das Imagens: Webshots.
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