ainda não sei quem estou
cresço no Outro em círculosa minha própria aceitação
e nada em mim seguro do que Sou
liberto-me na revolta
nuns dias em que sozinha habito o mundo
e então vivo do verbo Ser
onde os ecos são longe e sem força de projecção
mas há um fosso intransponível
que me sitia
entre o que me penso e o que estou
uma diferença perdida entre a cabeça e a vida
que às vezes trago da luz e vence todos os censores
perfilados à porta da dor antiga
mas logo descanso os olhos a salvo da nitidez
que me fixa...
nasceu lá atrás
no princípio dos tempos que empurrei do caminho
a força maior das buscas que me compõem
e das lutas que me deformam
um querer tocar a perfeição sem estrela-guia
e lutar depois insanamente contra ela
tecendo ponto por ponto
a malha de cada lágrima
em inabaláveis estruturas de imperfeito
e abraçada paralisação dos sentidos
cegar calar ensurdecer
e dormir
dormir os tempos
para não saber
as eternidades que me separam de tudo o que preciso ser
para me validar
para estar quem Sou
nuns dias de pássaro
depois locomotiva
tantos outros silêncio
e o mais deles canção
entre o pensar-me e o saber-me
existe o fumo das ausências que me pressentem viagem
e os ferros da prisão que me formatam paragem
sou livre quando adormeço
de pé
nos sonhos que pinto para me emprestar
com o olhar da vontade que me pertence
mas nada em mim seguro do que Sou
chego todos os dias
numa manhã farta de névoa
carregada do verbo estar
para morrer a cada madrugada
num beco da consciência
lotado de escuridão
onde me largo aos contentores
dos que se respiram por hábito
alma descalça em corpo nu
abrigados no vento contra a vida
Ana Vassalo
19-Dec-2012 – 18:30
(Imagem: "Fallen nude", Heather Marie Craft, USA)
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