Art
by Amy Marie Adams, Embrace
I
don’t suppose I really know you very well - but
I know you smell like the delicious damp grass
that
grows near old walls and that your hands
are
beautiful opening out of your sleeves and
that
the back of your head is a mossy sheltered
cave
when there is trouble in the wind and that
my
cheek just fits the depression in your
shoulder.
― Zelda Fitzgerald
Pedem-me
verdade, todos os dias. O que não deixa de ser curioso, como se
há-de notar...
Se
tenho saudades do amor?...
Mas
seria possível não ter?
Amar
e ser amado é um dos campos da questão e está preenchido.
Exercer-se nesse amor, é um outro. Ao Tempo falta a coesão numa
ideia de Amor, da generosidade que ele comporta. Chegar ou não,
vencer, eis a questão.
Porque,
de amor, o que eu espero hoje é, exactamente, essa mesma “verdade”,
toda a verdade e nem um malabarismo mais que a verdade.
Terna
e simples, praia ou desassossego, fria, chama, talvez crua, até
naufrágio. Mas é o que espero e o que sempre pedi, como requisito
único: a verdade por horizonte.
Talvez
por sentir que nela se guarda a secreta morada da união, a casa que
nos soma consecutivamente como um.
Agora...
Se tenho saudades do amor? Sempre.
De
amar sem equação nem fronteira, do sentir desordenado, de correr
com o coração, sem gps, por um outro que se perdeu no meu.
De
pensar o amor como criança: não o pensando.
Tenho
essa imensa saudade de fusão, de rir, sonhar, disparatar, escrever
traços de vida a dois.
Como
um dia, outros dias, aconteceram todos os princípios.
Mas
não da dor que comparece, tomada de pressa e inflada de poder, para
nos despenhar, sem aviso, no chão da nossa inocência, quando a
razão se perfila e nos estampa no coração aflito a transitoriedade
da coisa certa e verdadeira, selada a mãos juntas sobre o livro dos
afectos que um dia nasciam vida.
Não
da mentira que a culpa faz chegar-se à frente, em nome de uma
qualquer distorcida noção de protecção.
Ou
do lento homicídio daquela cumplicidade que pensáramos inesgotável
e nos fazia militar na construção de cada maravilha, que era o
pensarmo-nos arquitectos de um só mundo, feito de nós.
Não
do desespero, da busca insana, errando a vida por uma explicação
que reponha a ordem no caos da memória, rasgada de sentir.
De
ter de partir sempre, de largar tudo querendo ficar, porque o sonho que pensámos
não era e não foi, afinal, e esse amor tão recitado só já se
reconhece nas avenidas omissas de caminho, juncadas de esquinas de
indecisão e rotina.
Não
dos silêncios opressores, afundados na tv, no jornal diário ou no
pc, das pantufas fabricadas nas usinas do deixa andar, o mesmo tanto
faz que se abisma depois com o nosso próprio e imprevisto silêncio,
ou, menos ainda, do moribundo beijo na boca com até amanhãs que
ansiamos acordem ontem.
Saudade
nenhuma da falácia que de repente nos cerca as horas e quer fazer-se
ouvir por entre a dormência que nos pára, a fraude desse outro
que nos chora ao ouvido – e como chora... - lutando por se renovar
em votos de amor eterno, há muito perdido na negligência dos
cansaços da imaginação, do apreço arquivado, da atenção
agendada.
Tampouco
do ciúme irracional, ou do cuidado que acorda tarde e a más horas,
em retoma perdida, para perceber que não somos, jamais fomos, não
queremos ser item garantido de ninguém.
Ou
da fuga da lealdade, transviada por becos escusos, que no mais etéreo
dia de promessas nos juraram para a vida e logo morre em segundos às
mãos indiferentes da cobardia, convocada por uma qualquer leviandade
de serviço.
Menos, muito menos, de ser secretamente exibida como montra, a imagem e a juventude tomadas
como asset, o cérebro usado e abusado em projectos culturais “comuns” de
proveito unilateral, adivinhe-se para que lado, e de repente somos só
mais um nome nos livros editados, perdido numa infinda lista de
agradecimentos, em jeito de recompensa final, mas nunca uma palavra
de apreço, a “inteligência” sempre reclamada e exibida a
serviço, explorada mas inibida logo que destacada pelos pares...
Não,
nunca mais, utilitário vivo de multitarefa que consta - involuntariamente porque
ingénuo - ordeiro e funcionário “por detrás” do homem de sucesso,
ou seja, no único lugar que alegadamente lhe compete.
E
que saudade pode subsistir de palavras que nos trespassam de dor, o
insulto demolidor armado de luva branca e crueldade, fazendo-nos
questionar a legitimidade da própria existência?
Nada
carece de promessas de eternidade, desse fictício mas arrogante
desejo de controlo sobre algo que não nos pertence, como pretende o
casamento ou qualquer tipo de união reclamada na posse.
O
amor sobrevive de verdade eterna, enquanto dura. Há que honrá-lo
até ao fim.
Mas
sim, tenho saudades, sempre tive saudades do amor.
Desse
que se mostra em puro rosto, nos fixa a perder de vista, branco e
amigo, a cada momento de vencer a vida.
Dos
olhos que projectam céu a cada porta de uma galáxia sem fim, das
bocas unidas em fome e ternura, urgência e poesia do coração que
pulsa um outro peito e para sempre se embala na mesma canção.
Saudade, assim.
De um certo,
imagético, amor feliz, que projecto em verdade mas ainda não
conheci.
Ana
Vassalo
Jun
6, 2016