Eu sei bem o q vou fazer. Vou para a rua e é já a seguir. Em velocidade. Arejar, aos berros dentro do carro, que isto assim não pode ser. Percebo, sim, que há um filme tragico-cómico instalado na minha vida. A rodar continuamente. Pois bem, vou matá-lo.
- Está lúcido, bem disposto. Tem dores na anca, estamos à espera do resultado da TAC - cabeça e anca.
Eu aqui, à espera, horas e horas a fio, calada que nem um rato, à espera.
- Já coseram o golpe na perna mas está bem. Carregado de analgésicos, por causa das dores na anca. Mas com o resto dos exames e análises está tudo bem.
Em Setúbal. Desta vez foi para Setúbal, para me tornar a espera ainda mais completa, já que deixar a minha mãe aqui sozinha tanto tempo durante o dia está fora de questão.
Três chamadas, e sempre a TAC, aquela desclassificada que não fala nem por nada.
E por fim, o telefone.
- Então?! Estás bem?
- Já cá estou! O rapaz está vivo, ainda mexe. Não te procupes.
Que bom, sempre aquele impecável sentido de humor.
- Tens noção do que nos fazes passar com tanta avaria?
- Não é de propósito, querida, são coisas que têm de ser feitas.
Uma árvore. O meu pai montou-se num escadote para aparar uma árvore. Lá bem em cima, pois claro. Aquele tipo de ideia brilhante que qualquer pessoa normal espera que o seu pai de 89 anos se lembre de maturar.
É.
Vou zarpar daqui antes de começar a partir uma cidade inteira. Isso. São coisas que têm de ser feitas.
Acabar com a reclusão, respirar fundo, topar com gente, ouvir ruído. Raios me afundem se eu não mato este filme de vez.